23/05/2011

Museologando avalia: CCBB Laurie Anderson e Mariko Mori



Aproveitando a iniciativa do Newton Fabiano e da Wendy resolvi dar uma passada no CCBB daqui do Rio de Janeiro para matar o tempo e encontrei duas exposições de arte contemporânea interessantes mas que em certos momentos lutam pelo mesmo espaço. A primeira acontece de 29 de março a 26 de junho e a segunda acontece 9 de maio a 10 de julho de 2011 e já atraía atenção do público muito antes de sua inauguração, uma vez que é difícil passar pelo local sem perceber a gigantesca “nave espacial” sendo construída na rotunda do centro. “É apenas uma obra de arte”, afirmam alguns dos componentes do educativo do centro quando questionados sobre o estranho objeto, mas esta resposta não satisfaz ao público que reage com estranhamento.

Wave Ufo exterior

Wave Ufo interior

Comparando esta obra com a que ocupava o local a poucos dias atrás da artista Laurie Anderson já dá para fazer uma análise muito significativa. A obra da Laurie é uma mesa onde ao apoiar a cabeça sobre os braços de uma determinada forma é possível ouvir uma música que vibra atrás do corpo do espectador. Particularmente a vejo como uma obra interessante, mas infelizmente eclipsada pela Wave Ufo da artista japonesa. Trata-se de uma “nave espacial” com oito degraus simbolizando os oito estados de consciência do budismo zen sendo o nono estado de consciência uma experiência dentro da nave.

Dentro da obra a experiência que o expectador passa não é tudo o que eles esperam. Junto com mais três pessoas que ao utilizarem eletrodos na cabeça que passam por um sistema de captação e transformação das ondas emitidas pelo pensamento. Estas ondas interagem com os pensamentos dois outros dois formando assim imagens de luz completamente diferente.

Handphone Table

Não sou crítico de arte, e nem estudo museologia para isso, por este motivo não vou me ater ao que acho das obras em si, mas sinto liberdade suficiente para dizer o que acho da exposição.

Em primeiro lugar é bastante visível o quanto uma obra eclipsa a outra. Quando se coloca uma “nave espacial” em qualquer lugar o normal é ter seu olhar direcionado para ela. Não que a mesa de Laurie Anderson não receba atenção, mas próximo a uma obra de 4 milhões de dólares como é Wave Ufo é difícil não nos sentirmos atraídos para o que esconde em seu interior. A experiência artística é interessante, a experiência do espetáculo nem tanto. O público que acostumado à sociedade em que tudo é espetacularizado espera no mínimo que após duas horas de fila se tenha uma experiência típica de parque de diversões. Mas esta não é a intenção da artista.

Nesta obra cada visitante só pode entrar em grupos de três, mais ou menos do que isso a obra não funciona. A interação dura aproximadamente 7 minutos para cada grupo de três, e depois disso o aparelho precisa descansar para voltar a funcionar, um procedimento para a conservação da obra. Ao todo, são aproximadamente 20 minutos entre um grupo e outro. O resultado? Desde a inauguração são esperados no mínimo duas horas de fila para conhecer a obra. Mas será mesmo culpa dos visitantes que esperam uma experiência surreal e se deparam com uma reflexão sobre estados de consciência e interação entre seus pares? Ou o marketing da instituição preocupada em números de visitantes em seus livros de visita não geram uma expectativa errônea do que se irá experimentar?

Oneness, exposição da Mariko Mori, acontece no primeiro andar da instituição. Possui um circuito fechado ao qual já tive notícias será continuado por uma exposição futura. Uma problemática arquitetural difícil de resolver principalmente em instituições que não foram projetadas para a função expositiva. Neste sentido os curadores fizeram o que estava dentro do possível e foram bastante felizes no projeto: ao iniciar com uma enorme tela onde a artista se coloca vestida como uma sereia ao melhor “estilo Otaku” no meio de banhistas de uma praia artificial, o visitante pode ter uma bela noção do que está por vir: a reflexão de uma sociedade extremamente tecnológica (representada pela praia artificial) que não percebe o outro (representada pela artista numa fantasia de sereia que não é notada). Em função desta característica bastante japonesa, o resultado é uma sociedade que olha muito para seu interior, por isso em Wave Ufo Mariko procura mostrar para nosso pensamento.

Empty dream. Um painel onde a artista fotografou uma praia artificial. Mariko é a estranha sereia em primeiro plano, mas também está colocada em outros pontos da praia. Mariko não é notada.

Ao longo da exposição podemos encontrar desenhos bastante abstratos ou vídeos com performances da artista. Em oneness, obra que dá título a exposição a problemática da espera X “experiência fenomenal” aparece novamente, pois tal qual Wave ufo, é necessário um tempo razoável na fila de espera e interação com um grupo, dessa vez, de seis pessoas. A obra consiste em seis alienígenas de mãos dadas de frente e formando um círculo onde seu peito pode ser tocado após o visitante se ajoelhar diante deles. Ao toque os seres ganham características vitais, mas para isso é importante que todos os seis visitantes toquem ao mesmo tempo num mesmo local do coração de seu aliem. A idéia é da interação entre diferentes pessoas e diferentes raças para um propósito comum.

Oneness (no MOMA)

Em seguida uma obra que lembra o Stonehenge onde cada uma das pedras simboliza um planeta do sistema solar. Sua cor se modifica de acordo com a sua aproximação com o sol. A idéia que permeia este universo de significações criado pela artista é a aproximação entre os diferentes povos, as diferentes culturas umas com as outras e consigo mesma. Isso é perceptível na última obra apresentada. Uma espécie de Pêndulo de Foucault. Pêndulo de Foucault é um experimento científico onde um pêndulo se movimenta de acordo com o movimento da Terra, e em nada tem a ver com o Filósofo.

Ao centro uma montagem que faz lembrar o Pêndulo de Foucault, nas paredes imagens em acrílico de elementos da natureza ampliados

Transcircle 1.1 meter

Se de um lado as obras de Mariko recebem uma boa atenção e respeito entre umas com as outras, na da Laurie Anderson não pode ser dita a mesma coisa. Localizada no segundo andar, o visitante se depara com uma enorme parede com desenhos que retratam uma experiência onírica da artista. Trata-se do Gray Rabbit, onde a artista representa um momento complicado de sua vida.

Este momento é representado em outras obras como na da imagem abaixo. Trata-se de uma autobiografia da artista em vídeo e música projetada na superfície de uma maquete feita de papel picado.

Gray Rabbit

Em Institutional Dream Series que o visitante ao se afastar para ver a fotografias da artista dormindo em lugares inusitados esbarra em uma vídeo-montagem. Como resultado ao apreciar uma obra, o visitante impede o outro de apreciar outra obra.


INSTITUTIONAL DREAM SERIES - 1972/1973 fotografias de Laurie Dormindo em lugares inusitados. Para visualiza-la é preciso tapar a obra que está em sua frente.

A expressão musical e uso de utensílios tecnológicos são fartamente utilizados, e já que isso é uma constante o que se espera é que no mínimo estes funcionem, o que não acontece com a grande maioria. E não apenas isso, a sonoridade de uma obra atrapalha da de outra.

TAPE BOW VIOLIN – 2010 (um violino tocado por um mecanismo eletrônico/mecânico não funciona)

Com Laurie Anderson a quantidade de obras expostas é muito maior do que as da Mariko, e o espaço muito menor, e as soluções não tão satisfatórias. Por exemplo, uma de suas obras fica escondida, e quando digo escondida quero dizer escondida mesmo! Trata-se de uma obra onde uma projeção em miniatura de Laurie Anderson narra uma história de Alexandre o Grande. Para descobri-la é preciso se dirigir a um corredor que dá acesso a uma das salas do teatro.

As duas exposições valem a experiência, pois dificilmente poderemos apreciar duas artistas de renome internacional numa mesma instituição brasileira. E caso você leitor (a) decida que é uma boa enfrentar horas de fila para compreender Wave Ufo, saiba que é possível apreciar a obra e acha-la interessante sem passar por este stress. Ou mesmo que ali ao lado existe uma obra interessantíssima da Laurie Anderson. Ou ainda que existem boas exposições sendo apresentadas em outras instituições ali ao lado do CCBB, como na casa França Brasil ou Centro Cultural dos Correios que recebeu um bom texto da Wendy e do Newton Fabiano.

Estas duas exposições servem para refletir como uma produção artística que propõe a união e o olhar a si mesmo pode ter sua proposta não percebida quando se tem um público ansioso por uma experiência espetacular por ser um público habituado com a “sociedade do espetáculo”. No final das contas o visitante não olhar para si, não reflete sobre a união entre os povos, e apenas torce para que as pessoas que estão na sua frente na fila desista.

Do outro lado, a Laurie Anderson que representa experiências de sua vida misturadas com a transitoriedade da vida moderna tem seu vasto arsenal produtivo eclipsado quando posto em relação a uma artista que provém de uma sociedade absolutamente moderna o que se reflete em suas obras. Dessa forma, uma mesa de madeira perde parte de seu encantamento quando colocada ao lado de uma nave espacial monumental e toda a exploração que faz da tecnologia para produzir sentido não faz sentido nenhum quando não funcionam.

Laurie Anderson:



Mariko Mori:

As duas:

Onde: Centro Cultural Banco do Brasil Rio de Janeiro – Rua Primeiro de Março, 66 – Centro – Rio de Janeiro (RJ)

Informações: (21) 3808-2020

5 comentários:

  1. Adorei seus comentários! Tô curiosa pra ver a Laurie aqui no Rio.. vi em São Paulo e gostei bastante, mas sei dos perigos que uma exposição corre com uma museografia ruim - que muitos casos é o que ocorre no CCBB do Rio pelo menos. O CCBB de São Paulo é menor e as obras ficaram mais agrupadas em pequenas salas. Parece que lá funcionou melhor... Fiquei mais curiosa pra ir lá!

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  2. eu fui nessa esposiçao muito legal mesmo

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