05/04/2012

Museologando avalia - Tarsila do Amaral: Percurso afetivo; e Modernismo: 90 anos de arte moderna no Brasil


Estão acontecendo neste momento na cidade do Rio de Janeiro, duas exposições que dialogam entre si. Uma no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) e outra na Caixa Cultural fazem recortes diferentes sobre o mesmo tema: Modernismo brasileiro. O CCBB com um recorte bem específico sobre a artista ícone deste momento traz a cidade uma exposição que já não acontecia a 40 anos. Trata-se de Tarsila do Amaral - percurso afetivo uma narrativa com um recorte de um período que engloba principalmente sua fase “Pau-brasil” onde representa as formas e as cores das terras tupiniquins, mas deixa um pouco de lado sua fase antropofágica, e de engajamento político.

Antropofagia, embora a fase antropofágica tenha sido pouco representada, o CCBB não deixou de fora esta obra

Se de um lado o CCBB fez um recorte bem específico sobre a narrativa apresentada, a Caixa cultural se perde em alguns momentos na exposição Modernismo - 90 Anos de 1922. O nome sugere um recorte comemorativo da semana de 1922 que aconteceu em São Paulo, no entanto, na primeira sala o visitante encontra o casal Lucílio e Georgina de Albuquerque dentre outros artistas mais acadêmicos. Não vejo nisso necessariamente um problema pois considero que seria interessante começar com um apanhado sobre obras anteriores ao movimento iniciado por Oswald e Cia já que o movimento plástico que se firma na semana de 22 é um rompimento com a escola academicista as quais o casal faziam parte. Mas este tipo de abordagem sugere que teremos um enfoque cronológico o que não acontece.

Com a sonoridade de "Pelo telefone", considerado por muitos críticos o primeiro samba de nossa história a ser gravado, a ambientação é prazerosa. Atravessamos uma cortina com uma pintura do Morro do Castelo e nos chocamos com uma fotografia de Augusto Malta no momento de sua demolição. Um momento bastante impactante. Mas a partir daí, a coisa começa a perder o rumo. Neste segundo momento encontramos três desenhos de Tarsila do Amaral, o que sugere que a artista participou da exposição de 22, o que não aconteceu. Uma natureza morta muito modesta da mulher que foi pioneira nestas novas linguagens plásticas experimentadas no Brasil, Anita Malfati, fica expremida entre uma porta que dá passagem para o teceiro setor expositivo e um Belmiro de Almeida. Algumas aquarelas cubistas, e a única escultura de toda a exposição também estão nesta pequena sala que compartilha com a série "Fantoches da meia noite" do Di Cavalcanti.

Fantoches da meia-noite, criado em 1921 por Di Cavalcanti



No quarto setor expositivo, o que mais me agradou foi um vídeo sobre Carlos Drummond de Andrade e um grande estudo do Portinari que também não esteve presente na semana de 22. O que me leva a uma reflexão inevitável pois assistir as duas exposições faz com que invariavelmente comparemos os aspectos positivos de uma em relação a outra. No CCBB foi interessante reparar que cada obra da Tarsila do Amaral, trazia não apenas os aspectos técnicos da obra como também as exposições as quais ela fez parte. Um dado importantíssimo, uma vez que foram tais exposições que projetaram a artista. Já a Caixa que tinha como pretenção apresentar uma retrospectiva dos 90 anos de uma das exposições mais importantes de nossa história, não deixa claro quais obras e quais artistas participaram da semana.


Em Tarsila do Amaral - percurso afetivo, temos um nome que por sí só tem um peso inexplicável na nossa história da arte, e que tem atraído uma quantidade considerável de visitantes. Ela fica em dois espaços do terceiro andar destinado geralmente a exposições menores. Num primeiro momento, como já foi mencionado, podemos ver as principais obras do período “Pau-brasil”, onde fomos prestigiados com “O morro da favela”, a surreal “Urutu” e algumas andanças pelo cubismo, além da principal obra da mostra “Antropofagia”. Alguns objetos e fotos fazem uma rápida contextualização da artista em seu período. Já no segundo setor, as obras são bem modestas e pouco representativas. Você vai encontrar alí um retrato pouco expressivo de sua sobrinha, e alguns retratos de pessoas próximas, como seu marido Oswald.

Morro da favela



A artista sem sombra de dúvidas merecia uma individual no Rio de Janeiro, mas talvez tenham faltado algumas obras. Se a meu ver, esta exposição está muito boa e atraí o visitante só pelo título por outro a instituição está um caos, por conta de outros eventos. Já foi mencionado aqui no museologando que o CCBB recebeu algumas das exposições mais visitadas no mundo, e isso é um ponto muito bom pois mostra que o público brasileiro não é assim tão alheio à arte como o senso comum costuma apresentar. Mas também não podemos de deixar de considerar que estamos falando de uma instituição cultural que não tem o espaço que talvez gostaria de ter, e por isso encontramos discrepâncias terríveis acontecendo no hall de entrada. Também já mencionei uma vez sobre a exposição da Mariko Mori, e a frustração de se esperar horas para se ter uma experiência artística numa de suas obras que ficava exposta no hall, mas o número de pessoas que a obra atraiu é o que realmente interessa a instituição e dessa vez o centro além. A nova estrutura que novamente atrapalha um excelente espaço de convício não tem nenhum vínculo com as exposições do CCBB. Esta megaestrutura que é na verdade um palco para a apresentação de uma peça de Nelson Rodrigues ocupa todo o espaço do hall, ultrapassa seus imites para uma rampa que chega até a frente da livraria, e sua altura chega próxima ao segundo andar da exposição. Ao que resta a pergunta: pra quê? É sempre maravilhoso assistir a uma peça no Nelson Rodrigues, mas a linguagem teatral é bastante ampla para se criar uma peça que não atrapalhe o tráfego de visitantes. Um detalhe, no momento da apresentação da peça, o visitante que estiver na entrada da Av. 1° de março não pode passar pelo hall, tendo que sair da instituição, e ir para a outra entrada se quiser beber água, ir ao banheiro, ou simplesmente pegar suas coisas guardadas no guarda volume.

Superado este stress inicial, sugiro que se você estiver interessado em conhecer as exposições, vá primeiro na Caixa Cultural, pois por mais que tenham algumas falhas comunicacionais, ela tem um bom apanhado de artistas importantes, nem sempre bem representados, mas importantes. Lá você verá Vicente do Rêgo Monteiro, Di Cavalcanti, Portinari, Lucílio de Albuquerque e Georgina de Albuquerque, Tarsila do Amaral (apesar de serem apenas três desenhos), dentre outros. Estando alí visite também as duas outras exposições de arte contemporânea que estão acontecendo na instituição, e essas sim estão maravilhosas!!!! Ainda este mês escrevo sobre elas. Depois de ter feito este apanhado, vá visitar a exposição da Tarsila, mas cuidado com o horário pois tudo indica altos índices de visitantes percorrendo o labirinto do palco encontrado no hall e amontoados para ver Tarsila. Também acontece no centro cultural, uma exposição dos Irmãos Campana e na sala Contemporânea, que tem como objetivo trazer sempre algum artista contemporâneo brasileiro, tem uma obra bastante instigante do José Rufino – Divortium Aquarum.
Tarsila do Amaral - Percurso afetivo

Modernismo: 90 anos da semana de 22

O CCBB fica na Rua Primeiro de Março, 66 - Centro Rio de Janeiro

A Caixa Cultural fica Avenida Almirante Barroso, 25 - Centro Rio de Janeiro

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